quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Programação 2012

NAEPP-Núcleo de Atendimento, Estudo e Pesquisa em Psicanálise

Programaçāo 2012

Janeiro
23 a 27
Mini curso: "A psicanálise na hipermodernidade" 18h-20h.
Para membros do NAEPP 120,00 Reais. Para não membros 200,00 Reais.
FevereiroSeminário "Um dia depois da 4a": Leituras de preparaçāo para o Congresso Internacional da MP em Buenos Aires.
Início das atividades permanentes dos Núcleos:
-Psicanálise de crianças
-Psicanálise e Arte
-Psicanálise e Drogadições

MarçoSeminário leituras freudianas (a cada 15 dias)aos sábados das 8h30 as 11h30.
O conteúdo se estenderá de março a junho e de agosto a novembro. Serāo os novos integrantes do NAEPP que irāo obrigatoriamente assistir a este seminário, bem como os membros do NAEPP.
Para os não membros: Mensalidade de 300$ (totalizando 2100$, que podem ser pagos a vista com 10% de desconto ou com cheques pré-datados pagos a secretaria do NAEPP).

Atividades permanentes dos Núcleos:
-Psicanálise de crianças
-Psicanálise e Arte
-Psicanálise e Drogadições


Abril
Seminários acontecem normalmente havendo recesso na semana do dia 23 ao dia 27 para o congresso em Buenos Aires.

Atividades permanentes dos Núcleos:
-Psicanálise de crianças
-Psicanálise e Arte
-Psicanálise e Drogadições


Maio
Seminário “Um dia depois da 4ª : Início dos cartéis* (esta atividade pode ser inserida nas atividades dos núcleos existentes). Início do estudo do livro "Relação mãe-filha".

Seminário Leituras freudianas

*Atividades permanentes dos Núcleos:
-Psicanálise de crianças
-Psicanálise e Arte
-Psicanálise e Drogadições

Junho
Seminário "um dia depois da 4a"
Seminário Leituras freudianas
Atividades permanentes dos Núcleos:
-Psicanálise de crianças
-Psicanálise e Arte
-Psicanálise e Drogadições

Julho
Apresentação dos trabalhos dos cartéis
Apresentação dos trabalhos do seminário Leituras freudianas
Minicurso: “A droga é uma droga ou o gozo da droga de vida?”
Aberto a todos: Para membros do NAEPP 120,00 Reais. Para não membros 200,00 Reais.
Minicursos a serem propostos pelos Núcleos:
-Psicanálise de crianças
-Psicanálise e Arte
-Psicanálise e Drogadições



Anna Rogéria Nascimento de Oliveira
Coordenadora do NAEPP/Goiás
Núcleo de Atendimento, Estudo e Pesquisa em Psicanálise
Cel.
(062) 8106 3322

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

PER + VERTERE - A ARTE DE GOZAR A QUALQUER PREÇO

PER + VERTERE – A ARTE DE GOZAR A QUALQUER PREÇO

Pensar a perversão causou-me embaraço, pois se trata de um estudo um tanto quanto polêmico. Por onde caminhar para além da escuta clínica, já que esta não a tenho? (ainda).
Iniciei meu estudo com Freud que dedicou sua vida a desbravar o universo psíquico humano, e para tanto pesquisou as perversões a partir do seu clássico trabalho de 1905 Três ensaios sobre uma teoria sexual, que ele inaugura um estudo mais sistemático e consistente sobre as perversões sexuais, assim definindo o que se conhece como a sua primeira teoria sobre o assunto. Neste artigo, ensaia um estudo das perversões para, por meio dessas, poder demonstrar a existência da normalidade e dos desvios da sexualidade infantil. Em 1910, publica Leonardo da Vinci e uma lembrança de sua infância, no qual aborda aspectos referentes à psicossexualidade desse artista, bem como, sua primitiva relação com sua mãe, o que vem a determinar uma identificação do menino com a mãe, tudo marcando o início da sua segunda teoria sobre as perversões. No entanto, é em 1927, no trabalho O Fetichismo que Freud estabelece a sua terceira teoria sobre a gênese dos mecanismos psíquicos da perversão, com o aporte de novas concepções referidas, sobretudo às defesas de renegação da angústia de castração.
Em um trabalho recente Campos (2010) salienta o significado do fetiche: “o fetiche é um substituto do pênis da mulher (da mãe) em que outrora o menininho acreditou e a que não deseja renunciar”. Assim, o fetichismo é tido como a recusa da percepção da diferença anatômica entre os sexos, ou seja, recusa da percepção de que a mãe não tem pênis.
Ainda Campos (2010) cita Clavreul (1990) em relação ao reconhecimento da diferença entre os sexos: “se trata não apenas de ter de conhecer uma particularidade anatômica singular mais contingente, mas também de ter de integrar o fato de que apenas a ausência pode ser causa do desejo”. Assim, a descoberta da diferença entre os sexos deveria ser a ocasião de uma reinterpretação relativa à causa do desejo e definitivamente, esta reintegração faltou ao perverso. Para o perverso coloca-se sempre a necessidade de transgredir uma lei, ou para, além disso, ele “recusa” a lei da castração para tentar substituí-la pela lei do seu desejo.
Outro valor assinalável da “recusa” é considerado por Deschamps (2008), segundo a autora no desenvolvimento o sujeito perverso ficaria preso a interrogação de ser ou não ser o falo, e dessa forma construirá uma estratégia para evitar a castração, isso caracterizaria o manejo perverso. Para muitos sujeitos perversos isso incluirá uma impossibilidade de realização do ato genital da sexualidade, como foi colocado anteriormente, tanto em seu objetivo quanto em seu objeto. Verleugnung, recusa é o mecanismo que sustentará a estrutura perversa, não pode reconhecer a castração e, se não é capaz de reconhecer a diferença anatômica entre os sexos, não será possível essa inscrição.
Em se tratando da perversão como estrutura, e mais especificamente a recusa na aceitação da diferença sexual, Lacan (1999) mostrou ser possível entender o discurso freudiano, livrando-o das aderências biológicas, compreendendo as “fases” como “estruturas” mais complexas, atemporais, organizadas a partir da relação com o Outro na dialética da demanda de amor e da experiência do desejo.
Lacan apresentado por Olimpio (2002) fortalece que na fantasia da diferença dos sexos, a criança atribui o falo a todas as pessoas, a atribuição fálica é universal. A falta se insere como estruturante pela constatação da ausência ou por sua ameaça de perda. Por isso o sujeito é incompleto, ameaçado pela falta e tem na insatisfação existencial o desejo de completude.
Se a criança percebe a mãe como alguém que não possui o falo, como uma pessoa faltante, castrada, mas que ao mesmo tempo não é desejosa do falo do pai e o destitui, promoverá em sua estruturação psíquica um investimento móvel do desejo. A criança se inserirá como sujeito faltante, mas não atribuirá ao falo do pai a castração, mas algo além deste objeto.
A mãe do perverso sempre teve um discurso muito ruim do pai, dizendo da sua incompetência e fragilidade, de modo que o perverso não reconhece o pai, pois esse não tem “competência” para aprová-lo. Ele se sente poderoso, pois acredita que é o único objeto de amor que faz a mãe gozar e a completa. Para o perverso, não importa que a figura do pai seja investida simbolicamente do falo. Ele o marginaliza, não o reconhecendo como representante da lei e o contesta. Há admissão da castração no simbólico, mas concomitantemente uma recusa – o desmentido.
O perverso aceita a angústia de castração sob a condição de transgredi-la. Ele não renuncia o falo, mas conjura de modo eficaz a angústia de castração. Assim, ele se esgota em demonstrar, regularmente que a única lei que ele reconhece é a lei imperativa do seu próprio desejo e não a lei do desejo do outro. O perverso não tem outra saída senão subscrever ao desafio da lei e à sua transgressão, sendo esses os seus traços estruturais. Ele transgride a norma porque sabe que ela existe, mas não a aceita.
Partindo deste esclarecimento sobre a perversão, ponho-me a refletir sobre o perverso em nossa sociedade moderna, esta, cercada de consumismo, onde a imagem é o que importa, uma cultura “narcísica”, e ainda, sociedade do espetáculo. Essas são algumas denominações contemporâneas que visam caracterizar as formas emergentes de subjetividade da “nova ordem social” (eh Caetano!!).
Ainda segundo Zygmunt Bauman (2009) em “Vida para consumo”, ressalta que tudo é temporário, e sugere a metáfora “liquidez” para qualificar o estado da sociedade moderna, que, como líquidos se caracteriza para uma incapacidade de manter a forma, não se solidificando em costumes e hábitos. Aqui entra o perverso que sem limites consome tudo, de produtos a ideologias e de práticas religiosas a sexuais. Vale tudo para ser alguém, mesmo que por breves instantes. Troca-se tudo. Troca-se de sexo, de cabelo, de cor, de nacionalidade. Troca-se de tudo, menos de time de futebol (este é imutável, ainda mais se for corinthiano!!!)
Parece pertinente também o ponto de vista de Charles Melman (2008), assinalando o princípio da busca imediata de prazer máximo, sem freios nem restrições em relação ao mundo virtual na atualidade proporcionado pela internet. Ali qualquer um pode viver uma série de vidas sucessivas sem nenhum compromisso definitivo. As pessoas querem se distanciar da realidade não porque ela seja assustadora ou sem graça, mas porque ela implica sempre um limite. Além disso, a realidade requer uma identidade, um objetivo mais ou menos claro na vida, ao passo que esses exercícios virtuais não pressupõem nenhuma identidade, nenhuma perspectiva e ainda derrubam todos os limites, incluindo os do pudor e da polidez.
Assim, faz-se mister concluir que (como diz Anna Rogéria) “o pai Freudiano está morto!”, pois o pai atual (Pai Real) não sabe ser pai como outrora, instituindo a Lei e os limites, e neste caso o perverso como sujeito sem Lei, tem desejo de fazer e o faz. Ele não propõe nada, simplesmente goza ao burlar a lei. Ele não quer uma nova lei, mais ampla. Ele quer a mesma lei. Ele precisa dela para gozar, pois só tripudiando dela é que seu deboche encontra satisfação.


Autora: Rosely Vieira Cecílio (membro do NAEPP – Núcleo de Atendimento  Estudo e Pesquisa em Psicanálise)

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

O que estão fazendo com O NOSSO FUTURO (as nossas crianças-adolescentes)?

Dias atrás, assistindo aos telejornais, ouvi noticias que me deixaram no mínimo curioso, a 1ª ) foi que o Conselho Nacional dos direitos da criança, estava discutindo em Goiânia em audiência pública, a violência contra a criança e o adolescente, especialmente no diz respeito ao desaparecimento de membros dessa população, noticias estas que estiveram alguns dias em evidencia na mídia, com o desencadeamento da operação 6º mandamento no inicio deste ano, onde a policia federal prendeu vários membros da policia de elite goiana “os homens de preto”, e depois de então, essa mesma, foi retirada das ruas para reformulação do seu plantel, e também mudanças estruturais, incluindo mudanças na cor dos uniformes e das viaturas, a acusação que pesou contra essa policia na época foi a de que, alguns de seus membros se associaram e formaram um grupo de extermínio, foram acusados de estarem exterminando pessoas envolvidas com o uso e trafico de drogas (supostamente uma grande parte era de crianças-adolescentes). No mês de agosto, esta policia voltou a atuar com a cor das viaturas e a do uniforme, igual à das rádio patrulhas.
2ª ) Coincidentemente e contraditoriamente, neste mesmo dia, em que se discutia em audiência publica, os desdobramentos das violações dos direitos da criança-adolescente no caso citado acima, principalmente o direito à vida, era anunciada a volta dessa polícia com a sua antiga cor “o preto”, à rua. Mudar a cor das viaturas e a do fardamento, não terá peso sobre a atual realidade social, a não ser que, juntamente com a volta da antiga cor, voltem também as antigas práticas “o extermínio”.  Segundo o comandante geral da PM-GO, Coronel Edson Araújo, o objetivo é reprimir contundentemente a violência na capital. Entende-se que o poder público tem que tomar providências sim, pois o mês de Novembro, se tornou o mais violento da história da capital goiana, até o dia 29 do mês em questão, 444 pessoas já haviam sido assassinadas, e ainda faltavam mais de 30 dias para terminar o ano.
Mas tem-se que ter o cuidado, pois a mídia coloca as coisas como se tudo fosse somente uma relação de causa e efeito, e fazendo assim, isola as outras variáveis que estão na estrutura do fenômeno violência.
Ao noticiarem que 90% dos homicídios envolvem crianças-adolescentes, e tem relação com o uso e tráfico de drogas, eles estão dizendo em uma linguagem subliminar, que os assassinados, são usuários de drogas que não pagaram os traficantes, ou traficante que mata o outro, por disputa de ponto de venda de drogas, nessa visão simplista, então, se você não é criança-adolescente-traficante, criança-adolescente-usuária ou traficante, ou usário (esse aqui adulto), ou não está devendo para algum traficante, só tem 10% de chances de ser assassinado kkkkkkk, parece uma piada, mas é sério, a mídia coloca, e a maioria da população engole isso. A mídia com essa visão massificante e simplista, colocando todos (traficante e usuário) no mesmo barco, nos tira a oportunidade de entender que o usuário de drogas é um cidadão de direitos, cujo principal direito é a vida, responsabilizam unicamente o sujeito, e por outro lado tiram a responsabilidade do poder publico de fomentar políticas para a prevenção, a reabilitação e a reinserção social.
Essa visão coloca como se, as pessoas que usam drogas não param, porque não querem parar. Como se ser usuário de drogas, fosse uma escolha pessoal, algo que o sujeito escolheu ser, tendo um monte de opções como: uma boa casa para morar, alimentação digna, as melhores vestimentas, os melhores calçados, sempre receberam cuidados dos pais, não estou querendo dizer que as pessoas se envolvem com essas praticas somente por não terem essas necessidade atendidas, essas são apenas variáveis que influenciam e  estão na raiz desse fenômeno. Já o traficante é um sujeito que realiza atos, (mesmo sabendo, que muitas vezes, os sujeitos se vêem obrigados a traficar, ou roubar, para sustentar o vicio) e todos os atos tem suas conseqüências, então se existe uma lei que o responsabiliza por seus atos, que seja responsabilizado na forma dessa lei,  mas é preciso entender que tanto, o tráfico, quanto o uso de drogas são um sintoma individual, e ao mesmo tempo um sintoma social, que cada sujeito poderá vivê-lo ou não, de forma singular, de acordo com a sua história de vida.
Também não pode-se perder de vista, que os sujeitos envolvidos neste cenário, ocupando o papel tanto de usuário como o de  traficante, só de estarem ocupando um desses papéis, já estão sendo penalizados,  e possivelmente poderão ser penalizados de uma forma mais contundente no decorrer de sua existência, como está sendo mostrado todos os dias  nos telejornais.

Autor: José Divino

Núcleo da Criança e do Adolescente (NAEPP – Núcleo de Atendimento Estudo e Pesquisa em Psicanálise); Membros: José Divino, Lívia e Fátima.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A sociedade contemporânea está se transformando em um palco de perversões?

A sociedade contemporânea está se transformando em um palco de perversões?

Vive-se na atualidade, uma grande onda de violência. Você liga a televisão na segunda –feira, e as chamadas dos telejornais que ganham mais destaque são as relacionadas à violência, mais especificamente aos homicídios, em Goiânia, o numero de homicídios deste ano, já superou o total de todo o ano passado. Mas há também os casos de violência contra as mulheres, as delegacias que atendem à essa população nunca estiveram tão movimentadas, outra população muito atingida por esse fenômeno, são as crianças-adolescentes (crianças até 12 anos e adolescente, dos 12 aos 18 anos, segundo o E.C.A), as delegacias que atendem essa população, estão funcionando a todo vapor, os Conselhos Tutelares que alimentam as Delegacias e os Abrigos  estão bombando, esses meninos (as) são produto, mas também são produtores de violência, uma vez que esta população responde por uma parcela considerável da violência que acontece na sociedade contemporânea, e também podemos pensar que estes (crianças-adolescentes) podem ser o futuro da violência, se algo não for feito, no sentido de tratar a violência nas suas raízes, e não apenas ficar apagando o fogo que está na superfície, e deixando as brasas que  não estão na superfície acesas. 

 Mas isso não é algo novo, no ano 2000, a Organização Mundial do Trabalho (OIT), nos mostrava números alarmantes em suas estatísticas:  5.7 milhões de crianças realizavam trabalhos forçados ou em regime de servidão, 1.8 milhões estavam envolvidas na prostituição e pornografia, e 1.2 milhões foram vítimas de tráfico.  E o que me tem chamado bastante atenção nas entrevistas apresentadas na televisão, de grande parte dos sujeitos que cometem delitos, é que não parece haver arrependimento de tais fatos, parece que não existe a marca da “culpa”.

            A escuta desses dados da Organização Mundial do Trabalho (OIT), e dos noticiários de televisão vem ao encontro de um tema muito discutido aqui no NAEPP – Núcleo de Atendimento, Estudo e Pesquisa em Psicanálise, este ano, que até foi tem de um Mini-curso em Julho, sobre uma possível   “morte do pai, postulado por Freud”.

Na realidade, vive-se em um tempo em que o “o pai Freudiano”, aquele que instalava a norma fálica, a ordem, o pai simbólico (aquele que mostrava os caminhos), que tem suas raízes na cultura, na religião e na tradição familiar, que permitia a estruturação psíquica do sujeito nos anos de Freud, esse pai, possivelmente está morto, ou no mínimo está passando por uma crise existencial muito forte, pois o pai atual (Pai Real) não sabe ser pai (nos termos do pai Freudiano), pois não passou pela experiência do “pai postulado por Freud” o que operava na ordem do simbólico, esse “coitado” também está se debatendo para saber o que é ser pai, ou como ser pai, temos aqui um pai que opera no real, não quer dizer que não opere simbolicamente, opera sim, mas em uma nova ordem simbólica, que não provoca no inconsciente do sujeito, os mesmos efeitos do pai dos tempos de Freud, e esse sujeito-pai está perdido, nessa nova ordem simbólica. Mas o que isso tem a ver com o tema deste artigo? A sociedade contemporânea está se transformando em um palco de perversões? Parece estar bastante relacionado, pois o que se vê na atualidade é que a sociedade contemporânea está meio perversa com essa ausência de pai, pois se analisarmos esse pai real, não fez efeitos no inconsciente como função paterna, mesmo que não tenha sido barrado pela mãe, porque nem precisa, pois se é fraco e não faz efeitos na antiga ordem simbólica (do pai postulado por Freud), então nem precisa ser barrado. Neste sentido pode-se dizer que esses desdobramentos estão produzindo sujeitos perversos (não quero dizer pessoas que só façam perversidades) e sim perversos no sentido de não comprometidos com a ordem do pai Freudiano (seriam vamos dizer assim uns perversos mais bonzinhos). E é isso que está aparecendo com uma freqüência considerável em minhas escutas, tanto clinica, como institucional, sujeitos que querem atingir seus objetivos, não estão ligando muito para as normas e as regras, se for preciso passam por cima dos outros para tal.

Percebo na minha experiência que os sujeitos ainda não estão sabendo como lidar com a falta do pai Freudiano, apresentam profundas dificuldades para viverem no mundo norteados pelo pai real, não sabem ouvir não, não respeitam as leis, não sabem perder.  E  na vida, se o sujeito não sabe perder, e não consegue lidar com as regras (com os nãos da vida) tem-se, sérias dificuldades de convivência, o que parece estar bem representando na crise generalizada de violência que está presente na sociedade contemporânea. E são esses sujeitos (produtos e produtores de violência) que estão vivendo sob os efeitos de uma nova ordem simbólica, que estão dando voz para a nossa escuta.

Autor: José Divino

Núcleo da Criança e do Adolescente (NAEPP – Núcleo de Atendimento Estudo e Pesquisa em Psicanálise); Membros: José Divino, Lívia e Fátima.

Avenida T-53 N 249 Setor Marista.

sábado, 12 de novembro de 2011

Texto apresentado na Jornada da Delegação GOIAS/DF da Escola Brasileira de Psicanálise



Novembro 2011

Anna Rogéria N. de Oliveira

“Anorexia, feminino e contemporaneidade”



Etimologicamente, o termo anorexia deriva do grego "an-", deficiência ou ausência de, e "orexis", apetite. Também significando aversão à comida, enjôo do estômago ou inapetência, as primeiras referências a essa condição surgem com o termo fastidium em fontes latinas da época de Cícero (106-43 aC.) e vários textos do século XVI. Durante a Idade Média, as práticas de jejum foram compreendidas como estados de possessão demoníaca ou milagres divinos. Bell, em 1985, relata o comportamento anoréxico realizado por 260 santas italianas aparentemente em resposta à estrutura patriarcal a qual estavam submetidas, e conhecido como “anorexia sagrada”.



A psicanálise verifica que esses transtornos alimentares não ocorrem apenas na aparência e em relação ao corpo. No fundo, são sintomas tributários das vicissitudes do amor e do desejo e do gozo. Temas estes articulados com a cultura. Neste trabalho gostaria de propor a seguinte questão: Seria assim a anorexia uma das traduções da impossibilidade do feminino  na  contemporaneidade?



Freud sustenta desde o início de seus trabalhos que as modificações corporais presentes na histeria eram expressões de uma afecção psíquica. Freud utilizou a observação, a descrição e o detalhamento do sintoma como seu método de investigação, a fim de demonstrar a reciprocidade da relação entre corpo e alma.



Segundo BIDAUD (1998), a anorexia é definida como uma patologia dos laços amorosos com o outro e consigo mesma; seria, fazendo um jogo de palavras, uma amorexia. É importante assinalar que, quando a anoréxica se entrega à restrição alimentar, por mais séria que seja, isso não a incomoda. Ela se posiciona em sintonia com esse jejum alimentar, tornando-o problema para o outro. Seu sintoma é a gordura (ou as curvas) que elas vêem em uma determinada área. É um excesso irredutível localizado no seu corpo.





Na anorexia o corpo toma dimensões fálicas onde o controle do mesmo subverteria a ordem do ser e do ter numa eterna militância do ter a morte passa a ser um mito debatido no corpo no cotidiano. O corpo serve então de instrumento de expressão de controle (ou ilusão deste) do seu desejo até mesmo nos limites da morte. Não tendo medo da morte a anoréxica se faz criadora do seu fim, mas também da sua origem. A dialética da finitude e do ser infinito é um dos ecos da atualidade. Numa época onde o pai está morto..ou pelo menos decaído como inscrever a ordem e a imposição dos limites? O corpo como um campo de batalha é um dos mandamentos de nosso tempo. Sob esse aspecto poderíamos pensar no que o discurso contemporâneo oferece para esse corpo e nas fraturas subjetivantes em que ele se vê sendo lançado.



A anorexia é uma das traduções da impossibilidade do feminino na contemporaneidade, ou da tentativa fracassada, do sujeito atual em se inserir virtualmente na cena do espetáculo.  Apresenta um espetáculo que responde à perplexidade de Freud, já que, em sua pretensão fantasística, ela é aquela que, por excelência, sabe o que quer. Porém, o que ela ignora é que esse querer determinado sustenta uma negação do desejo.  "O querer garante a presunção do saber absoluto, mas esse corpo subjugado constitui uma barreira para algo que não quer se expressar, que é o desejo pelo outro" (ASSOUN, 1993, p. 118). Renegação da sedução: desencanto e ausência de sexualidade. Gozo.



Gozo em sua tenacidade, de superar o esperado, de seu superinvestimento no vazio, sustentando uma fantasia de onipotência, que até pode vir a se expressar narcísicamente através de ideais éticos e estéticos, de perfeição física e moral, o resultado dessa estratégia será sempre o fracasso.



Essa questão se faz explícita, se concretiza no próprio corpo da anoréxica, uma vez que atingir ao corpo ideal corresponderia a um padrão que, ao mesmo tempo, a identifica e a faz perder sua identidade subjetiva. Um corpo uni-forme, que devora a diferença, que não sustenta a bissexualidade psíquica constitutiva do sujeito. A cega determinação em negar a questão da falta se articula com a construção da imagem de um corpo ideal que lhe é particularmente conveniente. Promove ainda a construção de uma nova identidade através de um "sou anoréxica", ou ainda, posiciona-se pela palavra dos familiares: "Tenho uma filha anoréxica". Solução de posicionamento subjetivo, de localização do gozo. Em outras palavras, nomear-se no feminino através do padecimento...o ser e nada símbolo ou melhor nova ordem simbólica para se inscrever no gozo do feminino.



Por não conseguir situar o outro na sua liberdade de sujeito desejante, a anoréxica tenta uma frágil sustentação ignorando o outro como tal. Ela se isola do desejo dos homens e inscreve em seu corpo a marca de sua estranheza. Apaga de seu corpo todo sinal exterior de feminilidade, disfarçando as saliências de seu sexo, ou então, oferecendo, através de sua aparência trágica, sua versão grotesca. O corpo é também aquele que condensa o valor erótico. É por ser libidinal que o corpo mortificado se opõe ao que lhe resta de vivo. O gozo se impõe como periférico, localizado nas bordas corporais, em objetos entendidos como que fora do corpo. Nesse sentido o corpo se opõe à carne – carne como corpo morto, esvaziado de gozo, deserotizado. O que ocorre é que, se por um lado a libido vivifica, por outro lado o significante mortifica, esvazia o gozo.



O próprio gozo porta em si um furo substancial, que nos mostra que o corpo encontra-se esvaziado de gozo, ou seja, não há gozo total, existe sempre um além, existe sempre um “mais de gozar”.



Segundo QUEIROZ (2004), em um levantamento da literatura sobre os "novos sintomas" e a contemporaneidade, podemos enxergar nossos tempos como o tempo da desrregulação. A regência da economia psíquica, que antes era exercida pelo recalque, agora é exercida pelo gozo. Nestes tempos em que a liberdade individual é colocada em primeiro plano, a rotina é banida, o tempo é vivido de modo retalhado com uma crescente desvalorização do passado, criando assim uma temporalidade operatória que substitui a histórica, desvalorizando o conceito de futuro enquanto produzido.



A clínica da contemporaneidade parece apontar para uma ausência de corpo, no sentido até de uma descarga maciça das forças pulsionais. A análise vai permitir o remanejamento através do Outro e o retorno da força pulsional sobre o próprio sujeito, isto é, sua libidinização, para que possa nomear seus objetos de desejo, em lugar de sofrer de tanto gozo. Dito de outro modo, a análise buscará a construção da referida corporalidade do eu através da transformação das forças pulsionais a partir da inserção do sujeito na cadeia significante.



Marcelo BIDEAU (1998) lembra que etimologicamente, "adicto" significa escravo, mas também pode significar não-dito, e é a partir dessa leitura que a Psicanálise vai poder escutar o corpo da anoréxica. Falar do corporal significa, fundamentalmente, apontar, por um lado, para as descrições corporais próprias de alguns fenômenos pulsionais, e, por outro, para o caráter unitário do psíquico e do somático. Uma resposta que torna urgente em saber o que vem a ser o feminino na contemporaneidade. A anorexia seria então uma resposta a uma pergunta que instaura uma lógica de gozar no imperativo...Já que se tem que gozar até o infinito então não...o nada... Nesta configuração cultural em que a falta, a categoria do impossível, é cada vez mais expulsa do discurso. E através de seu corpo, limite fronteiriço de sua subjetividade, que mais uma vez o sujeito acha alguma forma de se colocar enquanto sujeito desejante, sujeito movido pela falta, sujeito que vive através da falta.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSOUN, P.L. Freud e a mulher. Rio de Janeiro. Zahar, 1993.

BIDAUD, É. Anorexia mental, ascese, mística: uma abordagem psicanalítica. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 1998.

FREUD, S. Casos clínicos I: Anna O. e Emmy Von N. 1895. Rio de Janeiro: Imago, 1997.

______. História de uma neurose infantil. 1918. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996. v. 17.

LACAN, J. O estádio do espelho como formador da função do eu tal como nos é revelada na experiência psicanalítica. In: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. p. 96 – 103.

_______Seminário, livro 11 de Lacan: Os 4 conceitos fundamentais da psicanálise (1963-64). Rio de Janeiro. Jorge Zahar, 1998.

______. Os complexos familiares na formação do indivíduo: ensaio de análise de uma função em psicologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.

MELMAN, C. O homem sem gravidade: gozar a qualquer preço. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 2003.

NASIO, J.D. A histeria teoria e clínica psicanalítica. Rio de Janeiro. Zahar, 1991.

QUEIROZ, E. F. A clínica da perversão. São Paulo: Escuta, 2004.

RECALCATI, M. Clínica del vacío: anorexias, dependencias, psicosis. Madrid: Editorial Sintesis, 2003.

RIBEIRO, C. N. G. Ana (orexia): uma imagem obscena. Recife: UNICAP, 2008. Dissertação (Mestrado em Psicologia Clínica), Centro de Teologia e Ciências Humanas, Universidade Católica de Pernambuco. Recife, 2008.

SOLER, Colette. 1989. O corpo no ensinamento de J. Lacan. Campo Freudiano. Belo Horizonte.


quarta-feira, 9 de novembro de 2011

IV Jornada da Delegação Geral GO/DF da Escola Brasileira de Psicanálise


IV Jornada da Delegação Geral GO/DF da Escola Brasileira de Psicanálise
11 e 12 de novembro de 2011 - auditório da Faculdade de Educação da UFG 
Que Lugar para o sujeito na nova ordem simbólica?
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Na contemporaneidade, não é mais o Ideal que funciona como bússola para as identificações do sujeito. A parceria estabelecida entre o capitalismo e o discurso da ciência produz em profusão objetos para a satisfação dos indivíduos, objetos que levam, por estrutura, ao sem medida do gozo, não deixando lugar para a falta e, consequentemente, impedindo o nascimento do desejo, intrínseco ao aparecimento do sujeito como postulado por Lacan.
A IV Jornada da Delegação Geral GO/DF da Escola Brasileira de Psicanálise será dedicada a interrogar as conseqüências do que chamamos ‘a nova ordem simbólica’ e suas fragilidades para o sujeito na sua relação com seu desejo e com seu gozo em sua singularidade. Como o psicanalista responde, nos dias atuais, para manter-se na contramão desse movimento, e assegurar a operatividade do ato analítico? É também outra questão que não perderemos de vista.  
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PROGRAMA
11 de Novembro – sexta-feira:
19:00 às 19:45 - Inscrições e entrega de material
19:45Abertura
Que Lugar para o Sujeito na Nova Ordem Simbólica? Ruskaya Maia – Coordenadora Geral da DG GO/DF
20:00Conferência 
O Sujeito e os Imperativos Contemporâneos - Maria do Rosário Collier do Rêgo Barros – AME da Escola Brasileira de Psicanálise
12 de Novembro – sábado:
09:00 – Mesa I: O sujeito, a criança e a família
A criança na contemporaneidade: A angústia que advém do sem sentido - Ceres Lêda Félix de Freitas Rubio
 Reflexões sobre o sofrimento da criança - Ana Paula Fernandes Rezende
Laços familiares contemporâneos e seus impasses - Giovana Bessa Borges Heinemann
Uma clínica do bem viver - Maria Noemi de Araújo         
Mediadora: Rosangela Maria Ribeiro 
10:30 – Mesa II: A clínica lacaniana e o sujeito hipermoderno
Anorexia e gozo no corpo Anna Rogéria Nascimento de Oliveira
Em que crê quem não crê? Giovanna Quaglia
  Uma inibição contemporânea - Ruskaya R. Maia
  A interpretação e seus efeitos na clínica psicanalítica - Denizye Aleksandra Zacharias
 Mediadora: Giovana B. B. Heinemann 
12:00 às 14:00 Intervalo
14:00 – Mesa III: A clínica inventada na via do último Lacan
 Além do saber na experiência analítica - Jaqueline Moreira Coelho
  ▪ A Topologia na Clínica Lacaniana - Waléria Maria Borges Vieira da Paixão
  O analisar hoje... Ordália Alves Junqueira
 ▪ A clínica psicanalítica hoje - Cristiano Alves Pimenta
 Mediadora: Ruskaya R. Maia
15:30 – Pausa para o café
16:00 – Mesa do Passe
Formação em síntese - Sérgio Passos Ribeiro de Campos – AE da Escola Brasileira de Psicanálise
Comentários: Maria do Rosário Collier do Rêgo Barros – AME da Escola Brasileira de Psicanálise 
17:30 – Encerramento
Waléria Maria Borges Vieira da Paixão

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

São apenas as crianças que não sabem ouvir NÃO?

Em meus atendimentos (minhas escutas), tanto na clinica como na instituição, algo que tem me chamado bastante atenção é a dificuldade que tanto crianças, adolescentes e adultos tem, em ouvir um “não” (lidar com os limites), e acolhê-lo, e essa dificuldade em lidar com tais situações me fez lembrar de Freud, do tão famoso complexo de Édipo, onde o pai tem um papel fundamental, estruturante. Me lembrei também de Lacan que postula que: não importa se o pai está ou não presente, se é ou não é  um bom pai. O que vai importar é o significante nome-do-pai, este vai dividir o ser feminino em mãe e mulher. São os efeitos da presença no inconsciente do significante nome-do-pai que intervém no complexo de Édipo, introduzindo na criança a norma fálica, organizando assim a relação entre a criança, a mãe e a função paterna (COSTA, 2007). Em minhas escutas, tenho percebido que o pai está presente, mesmo que nunca tenha existido na vida da pessoa, está presente na ausência.
No meio deste ano discutimos aqui no NAEPP – Núcleo de Atendimento, Estudo e Pesquisa em Psicanálise, justamente sobre uma possível “morte do pai” postulado por Freud, O pai postulado por Freud, o que instala a ORDEM, o pai simbólico (aquele que mostrava os caminhos), que tem suas raízes na cultura, na religião e na tradição familiar, que permitia a estruturação psíquica do sujeito nos anos de Freud, esse pai, possivelmente está morto, como função estrurante, mas está vivo ao mesmo tempo, no clamor que as pessoas fazem por ele.  As pessoas ao clamarem pelo pai morto, estão lhe dando vida, é como se ele estivesse dormindo e querem acordá-lo, ou o melhor aqui seria ressuscitá-lo, já que supostamente está morto. Este pai morto-vivo está morto, mas existe um pai que está bem vivo, é o pai, filho deste pai que está morto vamos dizer assim, ou seja um novo pai, com roupagem diferente, um pai fraco, que não estrutura e não instala a ORDEM, ou seja não tem efeitos na ordem do simbólico, é um pai real. Esse pai real (Que não mostra nenhum caminho, pois ele também espera que lhe seja mostrado um caminho) clama por um pai, (O que opera o corte, instala a ordem, as normas, quer alguém que lhe mostre o caminho) e ao mesmo tempo não sabe como ser um pai, (Pois não passou pela experiência do “Pai de Freud”). Estas são as pessoas que estão falando na clinica e na instituição, tentando à sua maneira constituir-se como sujeito desejante. E para tal, tem que estar bem claro para o psicanalista, qual é o seu papel. O papel do psicanalista, não é o de desejar algo para alguém, mas de ser aquele graças a quem o sujeito possa chegar até seu desejo.

Autor: José Divino

Núcleo da Criança e do Adolescente (NAEPP – Núcleo de Atendimento Estudo e Pesquisa em Psicanálise); Membros: José Divino, Lívia e Fátima.

Avenida T-53 N 249 Setor Marista.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

ARTE & PSICANÁLISE em : O palhaço.

Ahh... Como é bom falar de Selton Mello... (Ator e diretor do filme " O PALHAÇO" ,ao qual acabo de assistir)
Bem, primeiro que falar de arte é bobagem, né? Reduz o seu propósito.Arte é pra sentir e não pra falar.Mas o filme de Selton, me desconcerta,pois é do tamanho do seu talento e da sua delicadeza artística. Os pais no cinema (desavisados) que levaram suas crianças, certamente motivados pelo nome do filme, logo nos primeiros minutos entenderam o equívoco. E há que se saber: não é porque é alegoria, que é pra criança,assim como não é porque é desenho animado, que é infantil.E embora sejamos todos ' velhas crianças' o filme é adulto pra caramba.
Enfim, o filme de Selton trata do palhaço à procura de sua alma .O personagem descobre o que todo artista deve descobrir ; que sem alma ele não consegue fazer o outro rir;que pra vender sua graça, é preciso acreditar nela.De outra forma, o que se explana é o próprio vazio.E é justamente do furo que Selton vai falar.O palhaço vai falar da falta e do desejo.E como sabe fazer bem feito,redondinho. A gente ri e chora assistindo. Suspira e reflete. Respira e se identifica,porque somos nós o palhaço. Em busca de: coragem para sermos nós mesmos (tal como a menina da espada - a mulher mais corajosa do mundo), em busca de amor (que pode ser da Ana, da fulana ou da menina que sorri no caminhão), em busca de ar,de alívio (que pode ser o ventilador que ele alucina e idealiza),em busca da gente mesmo.O pai (feito pelo irretocável Paulo José), figura crucial e definitiva, lhe deu um lugar;um lugar no espelho.O lugar do palhaço filho , no circo do palhaço pai.E foi tão bonito quando num ato de amor, lhe liberou para se deslocar e se despregar da estória dele mesmo, para a qual (agora guiado pelo próprio desejo), ele retorna (como não poderia deixar de ser) regojizado de si,trazendo sua própria estória.(tão bem representado pelas cenas onde ele descobre que precisa fazer a sua carteira de IDENTIDADE para ser alguém reconhecido como alguém).
O filme fala tão bem da falta,e de questões outras tantas, que para mim, mera espectadora, não lhe falta nada. Lindo! Lindo! Lindo Selton ! Das coisas indizíveis, a arte fala tão bem... Aplausos, por favor.



Mirelle Araújo

O ``problema`` está na criança? Ou na dinâmica familiar?

Segundo Freud, a pessoa através de sua constituição inata associada às influencias sofridas nas vivências de suas relações com as imagos: paterna, materna ou fraterna, nos seus primeiros anos de vida, elabora maneiras de se conduzir na vida erótica (enamorar-se), estabelece o que ele chama de “clichês”, ou compulsão à repetição (FREUD, 1995). E são estes os nossos clientes (crianças-adolescentes) que geralmente chegam à clinica, conduzidos pelos seus pais, é comum ouvir dos genitores, eu o trouxe  porque ele (a) está com esse (s) ``problema (s)``,  para o senhor resolver  para mim, percebe-se ai, que não existe a visão de uma relação afetada por diversos fatores. A visão trazida por eles (genitores), parece ser a mesma de quando o seu automóvel dá um defeito, e ai, é só o levar na oficina que o mecânico conserta, mas com a criança-adolescente, não funciona assim, Lacan nos alerta que, o sintoma da criança acha-se em condição de responder ao que existe de sintomático na estrutura familiar, (Estrutura Mítica Edípica). O sintoma pode representar a verdade do casal, ou a da mãe e barrando a sua verdade, e ai, quando o casal percebe que essa dinâmica, a familiar, não será tão fácil assim de  ``consertar``, sem se envolverem no processo, geralmente retiram a criança-adolescente do atendimento.
Autor: José Divino

Núcleo da Criança e do Adolescente (NAEPP – Núcleo de Atendimento Estudo e Pesquisa em Psicanálise); Membros: José Divino, Lívia e Fátima.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

A Análise é só para os adultos, ou as crianças também são analisáveis?

Françoise Dolto acreditava, e nós, à partir de nossa experiência clínica, também acreditamos, que os pequeninos são analisáveis. De acordo com Françoise Dolto, as crianças dispõe, à sua maneira, de um acesso à linguagem. O ser humano é um ser de linguagem, antes mesmo de saber falar. O bebê expressa um extremo desejo de comunicação, que após nascer precisa receber um banho de palavras, o que é primordial para sua sobrevivência. O trabalho do psicanalista inclui a decodificação de uma linguagem que perturbou o desenvolvimento antes da fala. A criança nasce imersa em um mundo simbólico. É importante perceber a linguagem em todas as suas dimensões além da fala. Quando a criança ainda não possui o recurso da fala, ela pode se expressar mordendo, sugando, adoecendo ou manifestando sua libido através do que está ao seu alcance.

José Divino, Lívia e Fátima; Núcleo da Criança e do Adolescente ( NAEPP – Núcleo de Atendimento Estudo e Pesquisa em Psicanálise).

sábado, 22 de outubro de 2011

SER TÃO GRANDE.

Convido à todos para assistirem  nosso espetáculo SER TÃO GRANDE (grupo de teatro Arte & Fatos- PUC Goiás) neste 25 de novembro de 2011, no Teatro do SESI (Av. João Leite, nº 1.013, Setor Santa Genoveva, ao lado do Clube Antônio Ferreira Pacheco .), às 19:00 hs . Com direção de Danilo Alencar e grande elenco.


A peça reune recortes de Guimarães onde aparecem personagens e cenas centrais do seu fabuloso trabalho com a linguagem , que tem como característica principal o super-realismo e a maneira particular de reinventar o indizível.   


Na literatura , Psicanálise e Guimarães também  aparecem juntos na obra : "Guimarães Rosa e a Psicanálise-Ensaios sobre imagem e escrita.", de Tania Rivera. O livro tece um delicado diálogo entre a rica literatura Roseana , as teorias de Freud e Lacan e questões oriundas da prática  clínica, explorando ressonâncias e contrapontos , e relançando de um campo para o outro,questões fundamentais a respeito do sujeito contemporâneo.
Freud afirmou que a ficção é o modo pelo qual se constitui o homem.Guimarães Rosa, "que a vida também é para ser lida". E muito mais...
Acho que podemos mergulhar em discussões bastante produtivas , do ponto de vista psicanalítico,se navergarmos pelas águas Roseanas.Espero que a nossa peça, de alguma forma, sirva para isso. E como já dizia "meu"bom e velho menestrel Montenegro : "Qua a arte nos aponte uma resposta, mesmo que ela não saiba"... Ou ao menos , boas perguntas.


Espero vcs no teatro.


Mirelle Araújo

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Rei morto Rei posto?


O Pai está morto?


Percorrem-se, dentro da obra freudiana, as diversas formulações a respeito do pai
– o pai sedutor, o pai no complexo de Édipo e sua relação com a instância
superegóica, o pai e a formação da cultura.

Lacan (1956/1957) coloca, em seu Seminário A relação de objeto, que a pergunta “o que é o pai” é uma questão não resolvida no centro da experiência analítica (Lacan,
p. 383). Trata-se, pois, de um enigma que, segundo Michel Silvestre, permaneceu “im-penetrável” para Freud até o fim de sua vida, assim como o enigma “o que quer uma
mulher”. De fato, a obra de Freud é toda marcada por tentativas de resposta a esse
enigma e por sua importância na constituição própria do psiquismo. O nascimento da psicanálise tem uma relação estreita com um declínio da imagem paterna na Viena de então...

O pai na psicanálise – eis o que iremos abordar nesta fala.

O pai freudiano:
Em ”A psicoterapia da histeria”, Freud (1895) deixa claro o ponto de vista de que a sexualidade estava no centro da explicação etiológica das neuroses. Em suas investigações, se apercebe de que tal sexualidade referia-se especificamente a uma sedução, predominantemente do adulto para a criança. Concluiu que os pais eram perversos e seduziam as crianças, chegando a associar a idade delas no momento da sedução com o futuro desenvolvimento da histeria. Sua teoria da sedução aponta para um pai pervertido. Entretanto, Freud percebe que as cenas infantis relatadas no decorrer da análise nem sempre eram uma realidade, mas sim uma fantasia inconsciente de sedução, o que derruba a causalidade factual na explicação etiológica da neurose. É o que ele escreve a Fliess quando lhe diz que não acredita mais em sua neurótica.

Octave Mannoni (1994) coloca que a teoria da sedução, apesar da distorção que continha, abria alas para o complexo de Édipo quando preconizava a violação da proibição do incesto como fator etiológico das neuroses, apesar de, naquele momento, ainda ser considerada real. “... essa hipótese etiológica não era senão a resistência que o protegia do conhecimento dos desejos edipianos  inconscientes.

Roudinesco (1998) nos lembra que a passagem da teoria da sedução para teoria da fantasia inconsciente colocou Freud, pessoalmente, em xeque: ao lançar dúvidas sobre o pai, também o fez sobre Jakob Freud, seu pai, e sobre ele mesmo com relação às suas filhas. Um ano depois da morte de seu pai, Jakob,Freud formula a teoria do complexo de Édipo. Lembremos que ele escreve a Fliess uma carta relatando um sonho que teve perto do dia do funeral de seu pai: viu, em local público, o aviso – “pede-se que você feche os olhos”. Freud interpreta tal sonho como:

... cada um deve cumprir seu dever para com
os mortos (um pedido de desculpas, como se
eu não o tivesse feito e estivesse precisando de
clemência. (Masson, 1986, p. 203)

A que Freud precisava fechar os olhos? À generalização do Complexo de Édipo?
O pai no complexo de Édipo. Mais uma vez buscando em si próprio as respostas aos enigmas em que esbarrava, Freud chega ao complexo de Édipo. Em sua “análise original” reconhece seus sentimentos de amor com relação à sua mãe e seu conflito de sentimentos em relação ao pai – ciúme e amor (ibid., p. 273). Em “O ego e o id” Freud (1923a) descreve o que seria o Édipo no menino: amor pela mãe, hostilidade pelo pai, ambivalência emocional. Em “Organização genital infantil”, Freud (1923b) apresenta a idéia de que para ambos os sexos há apenas o órgão genital masculino, o que permite dizer que há primazia não dos órgãos genitais, mas do falo. A crença do menino é a de que todos têm pipi e a descoberta, através de uma pesquisa, de que nem todos o têm, necessita explicação. Inicialmente pensa que ele crescerá e, mais tarde, atribui a falta a uma castração.

Neste caso, a mãe é preservada, não-castrada. Assim, há duas possibilidades, aponta
Freud: possuir o órgão genital masculino ou ser castrado. No ano seguinte, em “A dissolução do complexo de Édipo”, Freud (1924) se pergunta sobre o que ocasionaria sua dissolução, fazendo-o sucumbir ao recalque. A resposta é fundada na ameaça de castração. Freud logo aponta que isto não se dá de uma só vez, havendo experiências que “… preparam para perda de partes altamente valorizadas do corpo” (p. 195). Refere-se a perdas parciais – seio, fezes... Mas a experiência que faz essa ameaça mais poderosa é a visão dos órgãos genitais femininos, pois torna concreta a perda do próprio pênis, e “a ameaça de castração ganha seu efeito adiado” (p. 195). Freud conclui que o “interesse narcísico” do menino triunfa frente ao seu investimento libidinal no objeto parental e “… o ego da criança volta as costas ao complexo de Édipo” (p. 196). O investimento de objetos é substituído por identificações, diz Freud. O supereu se forma.

No caso da menina, a dissolução do Édipo se dá por outra via, por uma troca simbólica entre pênis e bebê. Com a não realização de tal desejo, o complexo de Édipo é abandonado (ibid., p. 198). Lacan divide o complexo de Édipo em três tempos e localiza o pai nesse contexto.

1)No primeiro momento, a criança se identifica com o que é objeto de desejo da mãe,
aquilo que se chamou falo.
2)Em um segundo tempo, o pai intervém como privador duplo: priva a criança do objeto de seu desejo e a mãe de seu objeto fálico. Sauret (1998) usa uma imagem para demarcar a função paterna aqui: diz que o pai real pode intervir como privador “fazendo a cama” para o pai simbólico. E então ele acrescenta algo importante: o pai simbólico deita-se nesta cama se a mãe o invocou como mediador. A questão toda está situada, então, em se localizar quem é o pai para a mãe, quem ela reconhece como importante, a quem ela refere como seu objeto de desejo. Assim, o pai vem na palavra da mãe, em seu discurso, ele é simbólico.
3)Em um terceiro tempo, o pai intervém como aquele que tem o falo e não como aquele que o é. Com isto, a criança percebe que há algo que a mãe deseja no pai, o falo, e então não se trata de ser privador. É neste lugar de quem tem, que o pai aparece para a criança como alguém a se espelhar, como o ideal do eu, pela via da identificação. Daí teremos o declínio do complexo de Édipo, que deixará um recalcamento originário como marca e o supereu como herdeiro. Michel Silvestre (1996) nos ajuda a entender qual é o lugar do pai na configuração edípica ao falar que a dissolução do complexo de Édipo implica a morte do pai:

… a entrada no Édipo é desencadeada pelo pai,
desencadeamento que é sucessivamente denominado
de obstáculo, detenção, interdição,
ameaça, dirigidos tanto à mãe quanto à masturbação.
A saída do Édipo, seu “declínio”, tem
uma única significação: a morte do pai, ou,
mais precisamente, a entrada em cena do “pai
morto”. (p. 90)


O Pai Lacaniano

A função simbólica do pai é a do pai morto,já que é como morto que ele pode ser equivalente a puro significante. E é por isto que o pai, o pai simbólico, se relaciona com a lei.

Para que haja alguma coisa que faz com que a
lei seja fundada no pai, é preciso haver o assassinato
do pai. As duas coisas estão estreitamente
ligadas – o pai como aquele que promulga
a lei é o pai morto, isto é, o símbolo do pai.
O pai morto é o Nome-do-Pai, que se constrói
aí sobre o conteúdo. (Lacan, 1957-1958, p. 152)

A teoria edípica aponta para um pai simbólico, possível pela “morte do pai”, por sua falta. Lacan (ibid.), no Seminário 5 – As formações do inconsciente, diz que o pai no complexo de Édipo é uma metáfora:

Que é o pai? (…) A questão toda é saber o que
ele é no complexo de Édipo. Pois bem, o pai
aí não é um objeto real, mesmo que tenha de
intervir como objeto real para dar corpo à
castração. (…) Ele tampouco é unicamente
um objeto ideal… O que lhes trago hoje,
justamente, dá um pouco mais de exatidão à
idéia de pai simbólico. É isto: o pai é uma
metáfora. (p. 180)

Da solução edípica resta o supereu como instância que internalizou a lei do pai, o que nos convida a tentar articular o que isso tem de relação com a função do pai. Uma vez que o supereu é a instância diferenciada do eu, com uma função censora, o representante da lei, como podemos articulá-lo com a função do pai, na psicanálise? Desavisadamente poderíamos supor que um seria o avanço do outro, já que o supereu é o representante da lei do pai internalizada, e o Nome-do-Pai o significante da função paterna.

Lacan (Idem, p. 186) coloca, exatamente, a função do pai, com a preocupação de logo esclarecer: O pai, para nós, é, ele é real. Mas, não nos esqueçamos de que ele só é real na medida em que as instituições lhe conferem, eu nem diria seu papel e sua função de pai – não se trata de uma questão sociológica – mas seu nome de pai.

O pai, portanto, para a psicanálise, só é real porque foi feito nome. E Lacan
(Idem, p. 187) chamará de Nome-do-Pai a essa função por ele exercida, conferindo-lhe
estatuto simbólico, ao dizer: A posição do Nome-do-Pai como tal, a qualidade do pai como procriador, é uma questão que se situa no nível simbólico. Pode materializar-se sob as diversas formas culturais, mas não depende como tal da forma cultural, é uma
necessidade da cadeia significante.

Assim, para a psicanálise, o pai que conta é palavra que estrutura, ele entra na relação de alienação mãe-criança, para fazer do pequeno ser em estruturação, sujeito de desejo. Também em Porge (1998, p. 157) encontra-se uma aproximação entre Édipo e Nome do-Pai, quando ele afirma que, na teoria freudiana, o complexo de Édipo “é um Nome-do-Pai que funciona aí onde justamente há um ponto em que a teoria não tem pai”. E explica: “Ele é um Nome-do-Pai porque é uma nominação do pai nos dois sentidos do termo: nominação de uma função do pai e nominação produzida por Freud a quem se pode imputar ser o pai da psicanálise.” Em A relação de objeto, seminário de 1956 1957, Lacan apresenta um desenho que repete em As formações do inconsciente, o qual lhe permite mostrar que “a posição do significante paterno no símbolo [é] fundadora da posição do falo no plano imaginário” (Idem, p. 189).

A transformação da relação dual mãe-criança, num ternário imaginário cujo vértice é ocupado pelo falo, numa simetria com o ternário simbólico, em cujo vértice está o pai, torna possível entender que o falo está aí, naquela posição, porque ele é um objeto privilegiado na ordem simbólica que aponta na direção de um para-além do desejo da mãe. Se não houver esse para-além, algo mais que a mobilize, não poderia andar a dialética edipiana: como poderia sair do aprisionamento imaginário essa criança que aí está, numa relação de pleno gozo de completude imaginária, se a mãe só tem olhos para ela?

Felizmente, para a criança, o falo – como ensina Lacan – é o objeto de desejo da
mãe, objeto ao qual ela terá acesso pela mediação do pai, mediação, no entanto, que
só ocorrerá na dependência da posição ocupada pelo pai na ordem simbólica (Idem, p.
190). Assim, a posição do significante paterno no símbolo funda a posição do falo no
imaginário. É nisso que consiste a metáfora paterna: na substituição do significante
materno pelo significante paterno. Dito de outro modo, do significante do desejo da mãe
pelo significante Nome-do-Pai.

Lacan (Idem, p. 197) destaca a relação entre o Nome-do-Pai e a lei, ao afirmar: O essencial é que a mãe funde o pai como mediador daquilo que está para além da lei dela e de seu capricho, ou seja, pura e simplesmente, a lei como tal. Trata-se do pai, portanto, como Nome-do-Pai, estreitamente ligado à enunciação da lei.

Há, assim, uma lei da mãe, a qual advém do fato de que esta é falante, podendo pronunciar algo de que necessita a criança para sair da condição de assujeito e aceder à de sujeito de seu próprio desejo. Não antes de concordar pagar o preço de aceitar a privação/castração da mãe. A lei do pai é o que retorna à criança quando a concebe, imaginariamente, como privadora da mãe. Lei que é palavra do pai, mediada pela mãe, condição para que ele apareça para o filho como aquele que detém o falo. Passaporte, portanto, para a saída do complexo de Édipo, que implicará numa identificação ao pai como “Ideal do eu”.

Jean-Pierre Lebrun (2010, p. 15)3, em O mal-estar na subjetivação, aponta o declínio da função patriarcal – que implica o declínio da função do pai no social. Para Lacan, é a instância psíquica cuja função, no plano simbólico, consiste em regular a estrutura imaginária do eu, as identificações e os conflitos que regem suas relações com os semblantes.

O maior sintoma da contemporaneidade. Diz ele: “Com efeito, é o sintoma maior de nosso social atual, no que ele segue em cortejo tanto com a evolução da democracia como com os progressos das tecnociências e com o desenvolvimento do liberalismo econômico.”

A avaliação leva em conta efeitos do avanço da democracia na ordem política e econômica, bem como na evolução dos discursos da ciência e da tecnologia, sem pender, todavia, para uma posição contra o progresso. Lebrun (Idem, p. 16) afirma que uma das conseqüências desse declínio da função patriarcal, na atualidade, é o descrédito observado em relação ao “lugar do pai no social”, o qual se torna visível também em relação a todos aqueles que ocupam um “lugar de autoridade ou chefia”.

De forma dramática, podemos ver isso, hoje, em relação ao professor. Tal como o pai, para ser amado, para ostentar um certo grau de reconhecimento social, ele se faz “brother”, muitas vezes, comprometendo o lugar de exceção que deve ocupar, por onde a legitimidade se impõe, não pela força, mas pela palavra. O desenvolvimento da ciência e da tecnologia, o avanço do capitalismo e da democracia são fatos históricos que abalam a função de referência, válida para todos até o início do terceiro milênio. Assim, o que era necessário, até então, mostra-se, agora, nada mais nada menos, do que mera “contingência histórica”, ou seja, o pai do patriarcado já não é indispensável para transmitir a terceiridade.

O que queremos ressaltar, porém, e que Lebrun (Idem, p. 17) defende, enfaticamente, é que o declínio da função patriarcal – ou da função do pai no social – não equivale ao declínio da função paterna – a função patriarcal correspondendo ao papel que o pai exerce no social, enquanto a função paterna tem a ver com “o lugar que o genitor, podendo ser qualquer outro, ocupa para a mãe e a criança, de forma a permitir a operação da metáfora paterna”.

Entretanto, mesmo que o declínio da função patriarcal, de cujos efeitos padecemos, não corresponda ao declínio da função paterna, ele “priva de sua legitimidade o exercício real da função paterna na família, pois o enodamento real-imaginário-simbólico é indispensável para o seu funcionamento.

Em consequência do declínio da função do pai no social, o pai de hoje já não se sente mais reconhecido nesse lugar de quem estabelece e impõe limites, já que a ordem, agora, é a do gozo sem limite, embora, como avalia, ainda, o autor citado, (Idem, p. 20), para que tal efeito não ocorra “basta que aquele que faz ofício de pai real não abandone sua tarefa, mesmo que este tenha perdido sua legitimidade histórica de antanho”.

Como se sabe, Lacan muito se empenhou para acompanhar os progressos do social e a própria formulação do conceito de função paterna é uma comprovação disso, na medida em que, naquele momento, ele tem claro o propósito de ultrapassar o que está compreendido pelo declínio do patriarcado, ou seja, o que é da função do pai no social. A função paterna é outra coisa.

Ao final do seu ensino, o conceito de Nome-do-Pai pluraliza-se como Nomes-do-
 Pai. Porge (Idem, p. 9) afirma que essa ortografia no plural não aparece em escritos publicados do próprio Lacan, podendo ser encontrada, no entanto, em seminários e conferências. Na aula de 11 de março de 1975, do Seminário RSI, ele diz: “Quando comecei [...] eu falei dos nomes do pai. Pois bem, os nomes do pai é isso: o simbólico, o imaginário e o real [...] é isso os nomes do pai, os nomes primeiros enquanto nomeiam algo.”

Para Porge (Idem, p. 160), “o plural os nomes do pai, aos quais são identificados real, simbólico e imaginário, significa esta conjunção, cujo operador é o Nome-do-Pai”. Mas será que essa conjunção, tendo o Nome-do-Pai como operador, ainda é válida hoje?

Na publicação mais recente de Lebrun (Idem, p. 86-7), ele nos diz que, com a pluralização [dos Nomes-do-Pai], “Lacan faz emergir uma nova modalidade de função paterna: não mais um Pai para todos, mas a cada um o seu”. Um detalhe, porém, não é mera retórica: que se possa dispensar o Nome-do-Pai, mas com a condição de poder servir-se dele. Dito de outro modo, é impossível ao que se fez humano livrar-se da instância fálica. Por isso, é de um para-além do que podem oferecer as pai – versões infinitas de Papai Noel que as crianças de nossa contemporaneidade precisam.

Como pai – versões, nesse momento, queremos entender as versões multiplicadas do pai, a partir da pluralização do Nome-do-pai, que apontaria para um dispositivo que Lebrun, (2008, p. 278), em A perversão comum, está chamando de “nomear-para”, em contraposição ao Nome-do-Pai. E ele toma o testemunho do próprio Lacan para dizer que, “este nomear pode não se acrescentar ao Nome-do-Pai, mas ao contrário, tomar seu lugar”. Desse modo, se a “nomeação” é uma metáfora, o “nomeado-para” seria uma solução metonímica onde metáfora não há. E isso faz toda a diferença, o que Lebrun (Idem, p. 279), ainda seguindo a mesma trilha, tenta explicar relembrando a afirmação de Lacan: “a mãe em geral basta para a operação do nomear para [...] não há necessidade de intervenção do terceiro”.

Mas, logo em seguida, mostra o limite implicado nessa afirmação lacaniana: “é que a mãe não poderá ser o pai real”. Voltando a Papai Noel, é nessa posição – a da mãe que não poderá ser jamais o pai real – que estamos vendo cada representação de carne e osso imposta às crianças de nossa contemporaneidade, como se fossem a representação do pai real. Na medida, em que o social atual já não confere a este pai seu nome-de-pai, isto é, sua função simbólica, o sujeito estaria como “em suspenso”, abandonado à perversão polimorfa infantil, à “mère-version”, ou seja, a um outro regime onde não é preciso metáfora (metáfora paterna), a metonímia sendo bastante, nesse caso, pois, se há terceiro, ele é meramente virtual.

Pressionadas pelo peso do imaginário que lhes antecipa a angústia de não poder desejar – porque o vazio, ele está cheio de sentidos – elas, as crianças contemporâneas, exibem seu mal-estar. As escolhas sintomáticas são as mais diversas: obesidade, anorexia, hiperatividade, dificuldade de aprender, agressividade, depressão, dentre outras. E nós, que podemos fazer? Vamos continuar apontando na direção da alternativa de poder dispensar-se do encontro com a perda? Vamos continuar, diante do mal-estar de nossas crianças e adolescentes, vestindo a roupa de Papai Noel?