quinta-feira, 12 de abril de 2012

Precisamos falar sobre a MÃE DE KEVIN e sobre NÓS.
Resenha sobre o filme : "Precisamos falar sobre Kevin" (2007)

Na tentativa de explorarmos a temática da hipermodernidade e suas consequências e configurações, nós do NAEPP,pela via da psicanálise , lançamos mão da sexta e da sétima arte como auxílio.Desta vez, 'la película' americana /inglesa entitulada "Precisamos falar sobre Kevin", fruto do 
 livro da incrível escritora Lionel Shriver (2007).

Para escrevê-lo ,ela estudou dezenas de casos e usou essas histórias para criar EVA, uma mulher de 40 e poucos anos que reexamina a sua trajetória em busca dos motivos que podem ter transformado ( e transformaram mesmo)  seu filho,Kevin, num cruel assassino. No livro, em longas e detalhadas cartas ao pai do menino, ela analisa o próprio casamento, o impacto da maternidade sobre sua antiga vida e momentos significativos da infância de Kevin. Seu relato é escandalosamente sincero , pontuado por confissões como a de um dia ter parado no meio da rua,diante das britadeiras de uma construção , e fechado os olhos de prazer ao notar que as máquinas encobriam o som do choro incessante de seu bebe, recém nascido.

Ora,durante milénios nos submetemos docilmente ao mandato do "crescei e multiplicai-vos", sem nada questionar.À medida que as mulheres começaram a se perguntar se queriam mesmo ter filhos, moralistas, filósofos,religiosos e políticos passaram a exaltar a magnitude social da função da maternidade.Para tanto, tentaram convecê-las de que eram sagradas, portadoras de um instinto natural que as tornava capazes de total entrega amorosa aos seus filhos.
É preciso coragem, como teve a americana Lionel Shriver ,para descrever uma maternidade e um filho bem diferentes disso.Monstruosos.
Eva , a personagem, é uma viajante, mulher livre e sua vida parecia plena mesmo sem a maternidade.No entanto, por amor ao marido que desejava ser pai, e levada pela ideia de que estaria embarcando em mais uma aventura,resolveu engravidar.O problema é que o arrependimento bate já nos primeiros acordes… O que vemos é um retrato angustiante das fantasias que se escondem no "lado negro"da experiência de gerar um filho.Bem à la " O Bebê de Rosemary", de Polanski (1968),onde o seu parto parece a irrupção de um alienígena , onde nasce o "filho do demónio" , Eva desenvolve com seu filho Kevin uma relação paranóica , onde o menino se comporta como a própria encarnação do demónio assassino, tal qual em A PROFECIA.
No entanto, em PRECISAMOS FALAR COM KEVIN, o filho-monstro já não veste ou serve à fantasia do filho de satã.Ele é mesmo fruto da rejeição materna, associado a uma figura de pai-morto.Parece mesmo ter nascido para "espezinhar"sua bondosa(?) mãe, a qual mal consegue cumprir o árduo trabalho de esconder o quanto acha seu filho estranho.Um estranho.
Kevin, por sua vez, cumpre seu destino edipiano.Comete um duplo e múltiplo  assassinato e seu crime condena mãe e filho (maravilhosamente misturados inclusive em imagens pelo diretor no filme) a viverem um para o outro.
EVA seria uma caricatura, mas também um retrato do que acontece com todas as mães ?

Shriver avisa: a maternidade pode destruir sua vida! 

O que Freud diria sobre isso ? E aquele seu fã, o tal do Lacan ??

Mirelle Araújo.