A sociedade contemporânea está se transformando em um palco de perversões?
Vive-se na atualidade, uma grande onda de violência. Você liga a televisão na segunda –feira, e as chamadas dos telejornais que ganham mais destaque são as relacionadas à violência, mais especificamente aos homicídios, em Goiânia, o numero de homicídios deste ano, já superou o total de todo o ano passado. Mas há também os casos de violência contra as mulheres, as delegacias que atendem à essa população nunca estiveram tão movimentadas, outra população muito atingida por esse fenômeno, são as crianças-adolescentes (crianças até 12 anos e adolescente, dos 12 aos 18 anos, segundo o E.C.A), as delegacias que atendem essa população, estão funcionando a todo vapor, os Conselhos Tutelares que alimentam as Delegacias e os Abrigos estão bombando, esses meninos (as) são produto, mas também são produtores de violência, uma vez que esta população responde por uma parcela considerável da violência que acontece na sociedade contemporânea, e também podemos pensar que estes (crianças-adolescentes) podem ser o futuro da violência, se algo não for feito, no sentido de tratar a violência nas suas raízes, e não apenas ficar apagando o fogo que está na superfície, e deixando as brasas que não estão na superfície acesas.
Mas isso não é algo novo, no ano 2000, a Organização Mundial do Trabalho (OIT), nos mostrava números alarmantes em suas estatísticas: 5.7 milhões de crianças realizavam trabalhos forçados ou em regime de servidão, 1.8 milhões estavam envolvidas na prostituição e pornografia, e 1.2 milhões foram vítimas de tráfico. E o que me tem chamado bastante atenção nas entrevistas apresentadas na televisão, de grande parte dos sujeitos que cometem delitos, é que não parece haver arrependimento de tais fatos, parece que não existe a marca da “culpa”.
A escuta desses dados da Organização Mundial do Trabalho (OIT), e dos noticiários de televisão vem ao encontro de um tema muito discutido aqui no NAEPP – Núcleo de Atendimento, Estudo e Pesquisa em Psicanálise, este ano, que até foi tem de um Mini-curso em Julho, sobre uma possível “morte do pai, postulado por Freud”.
Na realidade, vive-se em um tempo em que o “o pai Freudiano”, aquele que instalava a norma fálica, a ordem, o pai simbólico (aquele que mostrava os caminhos), que tem suas raízes na cultura, na religião e na tradição familiar, que permitia a estruturação psíquica do sujeito nos anos de Freud, esse pai, possivelmente está morto, ou no mínimo está passando por uma crise existencial muito forte, pois o pai atual (Pai Real) não sabe ser pai (nos termos do pai Freudiano), pois não passou pela experiência do “pai postulado por Freud” o que operava na ordem do simbólico, esse “coitado” também está se debatendo para saber o que é ser pai, ou como ser pai, temos aqui um pai que opera no real, não quer dizer que não opere simbolicamente, opera sim, mas em uma nova ordem simbólica, que não provoca no inconsciente do sujeito, os mesmos efeitos do pai dos tempos de Freud, e esse sujeito-pai está perdido, nessa nova ordem simbólica. Mas o que isso tem a ver com o tema deste artigo? A sociedade contemporânea está se transformando em um palco de perversões? Parece estar bastante relacionado, pois o que se vê na atualidade é que a sociedade contemporânea está meio perversa com essa ausência de pai, pois se analisarmos esse pai real, não fez efeitos no inconsciente como função paterna, mesmo que não tenha sido barrado pela mãe, porque nem precisa, pois se é fraco e não faz efeitos na antiga ordem simbólica (do pai postulado por Freud), então nem precisa ser barrado. Neste sentido pode-se dizer que esses desdobramentos estão produzindo sujeitos perversos (não quero dizer pessoas que só façam perversidades) e sim perversos no sentido de não comprometidos com a ordem do pai Freudiano (seriam vamos dizer assim uns perversos mais bonzinhos). E é isso que está aparecendo com uma freqüência considerável em minhas escutas, tanto clinica, como institucional, sujeitos que querem atingir seus objetivos, não estão ligando muito para as normas e as regras, se for preciso passam por cima dos outros para tal.
Percebo na minha experiência que os sujeitos ainda não estão sabendo como lidar com a falta do pai Freudiano, apresentam profundas dificuldades para viverem no mundo norteados pelo pai real, não sabem ouvir não, não respeitam as leis, não sabem perder. E na vida, se o sujeito não sabe perder, e não consegue lidar com as regras (com os nãos da vida) tem-se, sérias dificuldades de convivência, o que parece estar bem representando na crise generalizada de violência que está presente na sociedade contemporânea. E são esses sujeitos (produtos e produtores de violência) que estão vivendo sob os efeitos de uma nova ordem simbólica, que estão dando voz para a nossa escuta.
Autor: José Divino
Núcleo da Criança e do Adolescente (NAEPP – Núcleo de Atendimento Estudo e Pesquisa em Psicanálise); Membros: José Divino, Lívia e Fátima.
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