Sejam todos bem vindos a este mini curso que irei ministrar sobre um tema recorrente em discussões da Nova Escola Lacaniana de Psicanálise e do Laboratório do NAEPP.
Mini curso livre
“A morte do Pai: um percurso pela Psicanálise e o Cinema.”
A função paterna é a que o pai ocupa na subjetividade isto é, o pai biológico não se superpõe ao pai simbólico, o pai biológico pode ou não estar na função paterna, geralmente está. O pai é da ordem simbólica, é o que conta no desejo materno. O pai é aquele que a mãe diz,independentemente de o ser biologicamente ou não. O Pai de Dora - para Dora é um pai castrado,impotente, na subjetividade desta, não importa o que ele era na realidade. O Pai de Schreber - o que não admite uma lei fora dele. O pai de Schreber estava no lugar da mãe fálica, da função materna. O pai do Homem dos Ratos - é o pai morto. Pai de Gide, pai de Joyce - um pai desconsiderado. E na contemporaneidade como o Pai se evidencia? O pai freudiano ainda responde e ecoa na clínica atual? Que aspectos singularizam O Mal-Estar na Civilização da atualidade? Para J. Lacan, o advento da psicanálise teria respondido à eclosão de uma crise psicológica típica do homem moderno, derivada de um declínio, socialmente condicionado, da imagem do pai. Neste mini curso abordarei a função paterna a partir da teoria e clínica de Freud e Lacan utilizando como recurso principal alguns trechos de filmes emblemáticos sobre este tema.
Coordenação: Anna Rogéria Nascimento de Oliveira
Psicanalista - AE/ELP
Escola Lacaniana de Psicanálise de Goiânia
Duração: 8 horas
Dias 25, 26, 27, 28 de julho
Local: NAEPP- Núcleo de Atendimento, Estudo e Pesquisa em Psicanálise
Rua T-53 n. 249 Setor Marista
Número de vagas: 10
Inscrição pelo telefone 81063322 a partir do dia 1º de julho.
Membros da ELP-Escola Lacaniana de Psicanálise e do NEAPP: $150,00 reais
(Inscrições antecipadas até dia 20 de julho $120,00reais)
Outros: $230,00 reais
(Inscrições antecipadas até dia 20 de julho $200,00 reais)
Anna Rogéria Nascimento de Oliveira annarogeria@yahoo.com.br
Cel.81063322
sexta-feira, 15 de julho de 2011
terça-feira, 12 de julho de 2011
Carta de Amor a Jabor : o que quer a mulher?
Goiânia, 29 de junho de 2011.
Carta de Amor a Jabor : o que quer a mulher?
Anna Rogéria Nascimento de Oliveira
A/E Escola Lacaniana de Psicanálise de Goiânia
Jabor em muitos artigos retrata o seu amor às mulheres que ele descreve como belas, misteriosas, complicadas. Em seus artigos sobre o tema do amor lá estão elas...as mulheres e o enigma que elas são para os homens e em muitas passagens ele se reconhece perplexo diante do desejo feminino. E ele não é o único...
Freud, sim sempre ele, inicia seu percurso de escuta escutando as mulheres. As histéricas da época que propunham o sintoma como metáfora do desejo. O enigma que envolvia o feminino perdurou durante toda sua vida. Entretanto este enigma fez com que a obra freudiana se destacasse no passado e até hoje se destaca, como o ponto de partida para o percurso onde o feminino pudesse ter um discurso. E como foi esse percurso? Um caminho que foi sempre revisto, desenvolvido e modificado de acordo com suas experiências clínicas. Esta é a beleza do texto freudiano. Ele não tem medo do erro e nem da falta de mestria da certeza.
Se, inicialmente, a preocupação de Freud estava relacionada ao trauma e à sedução, aos poucos tende a acreditar que o trauma não era a própria sedução e sim a recordação da cena. As histéricas sofriam de reminiscências, o que fez Freud reconhecer a importância da sexualidade e a sua ocorrência em dois tempos marcantes: a infância e a adolescência. Até que Freud deixasse de acreditar em sua neurótica e passasse a privilegiar a fantasia, era com as reminiscências inconscientes que ele se ocupava: as histéricas sabiam, mas não sabiam que sabiam...
Assim, a fantasia passa a ser elemento significativo na produção dos sintomas histéricos. Foi com Dora (1905) - símbolo freudiano na compreensão da histeria que ele percebe toda a fantasmática que envolvia o sintoma conversivo. A partir daí, a angústia, provocada por uma fantasia inconsciente, passa a ter um papel decisivo na estruturação das neuroses. É essa angústia que, nas histéricas, Freud chama de inveja fálica, que seria convertida. Muda-se o cenário, muda-se a cena: o que antes era sofrido no psíquico passa a ser sofrido e gozado no corpo.
A partir da letra freudiana podemos perceber que o caminho da mulher em direção à feminilidade, coloca-a diante de uma questão: não é e nem não é. Tomada como enigma insolúvel - a feminilidade – impossível de ser apreendida – encontra na mascarada, uma ponta por onde inventar-se.
Duas palavras se repetem no percurso daqueles que se colocam no lugar da escuta destas questões: aventura e enigma, na medida em que elas fundamentam tudo o que estaria condensado na palavra feminilidade. Para o psicanalista, o elemento aventura está em supor uma viagem pelo imprevisível e no limite do indizível, o que se contrapõe ao registro fálico. Sob o registro fálico o sujeito está ligado à universalidade, a totalização, e ao controle das coisas e do outro. Sob o registro do feminino o que estaria em jogo seria outra coisa: uma postura voltada para o particular, para o não controle e o relativo. Ou seja, a feminilidade abrangeria algo muito distante da postura fálica, algo que marcaria a diferença de um sujeito em relação a qualquer outro.
Sim, de um sujeito em relação a qualquer outro, o que implica em não esquecermos que a questão da feminilidade também diz respeito aos homens. Em 1937, Freud já falava de um princípio geral que estava em ação em ambos os sexos e que, embora diversos em sua forma de expressão, referia-se a uma atitude frente ao complexo de castração. O que quer dizer que, como registro erógeno e psíquico, a feminilidade não diz respeito somente às mulheres. O que Freud nos assinala é a precariedade da condição humana se construída a partir de um referencial fálico tanto da mulher quanto do homem.
Deve-se observar que pesar de seu incansável trabalho de escuta e investigação do feminino, os impasses da sexualidade levaram Freud a se deter ante a ‘rocha viva’ da castração, que para a mulher é marcado pela inveja do pênis. Lacan, por sua vez, encara o desafio de investigar um mais além da castração – da divisão falo/castração, introduzindo a questão do gozo. É o Seminário 20 que marca o percurso do ensino lacaniano em direção a uma outra lógica distinta da lógica fálica, de atribuição dos valores fálico/castrado. A outra lógica em jogo no mencionado seminário é a das fórmulas quânticas de sexuação onde ele apresenta a oscilação da mulher o saber e o não saber. Saber sobre a falta que a constitui como ser falante, saber sobre o gozo. Saber fazer com o real do corpo, considerando é claro que o “desejo se inscreve por uma contingência corporal.”
“O ser sexuado dessas mulheres não-todas não passa pelo corpo, mas pelo que resulta de uma exigência lógica na fala. (...)
Lacan. Seminário 20.
Então, para Lacan a problemática feminina poderia ser colocada como uma conseqüência ou efeito que a função do falo como significante exerce no inconsciente e à maneira pela qual os sujeitos se declaram sujeitados à sua lei. É impossível escrever uma função que ligue direta e completamente o homem à mulher e que seja assim objeto de um saber.
No texto Freud e a Mulher, Assoun (1993) coloca o enigma como um efeito do real da feminilidade “invertendo-se numa indagação ao saber analítico”, uma provocação. Uma indagação sobre seu objeto, mas também sobre seu saber. O que implica na seguinte questão: O que tem a psicanálise a dizer hoje sobre a mulher e a feminilidade?
Será o feminino um paradoxo?
Se o desamparo feminino nos remete imediatamente para o que existe de mais incompleto no ser humano, também remete para a conseqüência maior disso: a dependência insofismável do outro. A clínica psicanalítica é a única que permite esta escuta privilegiada. E ainda que essa dependência não seja absolutamente superável porque ela estará lá - sempre presente – nos fazendo lembrar a todo o momento a fratura constitucional que marca a condição humana é ela que nos faz continuar desejantes. (Birman, 1999)
“Nas verdadeiras mulheres há sempre algo meio extraviado; há na feminilidade verdadeira, uma dimensão de álibi.” Lacan, Seminário 5.
*Leituras consultadas e recomendadas sobre este tema:
ASSOUN, P.L. Freud e a mulher.Jorge Zahar. Rio de Janeiro.1993
Birman, J.Cartografias do Feminino, Editora 34, São Paulo, 1999.
________Mal-Estar na Atualidade. A psicanálise e as novas Formas de subjetivação, Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2000.
Freud, S Psicopatologia da Histeria (1886-99) em Edição Standard das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud Vol. 1, Imago Editora, Rio de Janeiro, 1969.
________Fragmento da Análise de um Caso de Histeria (1905) Vol. VII
________Feminilidade (1933) Vol. XXII
________A Organização Genital Infantil: Uma interpolação na Teoria da Sexualidade (1923) Vol. XIX
________A dissolução do Complexo de Édipo (1924) Vol.XIX.
LACAN, J. Seminário 20. Mais, Ainda. Jorge Zahar. Rio de Janeiro. 1995.
LACAN, J. Seminário 5. As Formações do Inconsciente. Jorge Zahar. Rio de Janeiro. 1999.
Carta de Amor a Jabor : o que quer a mulher?
Anna Rogéria Nascimento de Oliveira
A/E Escola Lacaniana de Psicanálise de Goiânia
Jabor em muitos artigos retrata o seu amor às mulheres que ele descreve como belas, misteriosas, complicadas. Em seus artigos sobre o tema do amor lá estão elas...as mulheres e o enigma que elas são para os homens e em muitas passagens ele se reconhece perplexo diante do desejo feminino. E ele não é o único...
Freud, sim sempre ele, inicia seu percurso de escuta escutando as mulheres. As histéricas da época que propunham o sintoma como metáfora do desejo. O enigma que envolvia o feminino perdurou durante toda sua vida. Entretanto este enigma fez com que a obra freudiana se destacasse no passado e até hoje se destaca, como o ponto de partida para o percurso onde o feminino pudesse ter um discurso. E como foi esse percurso? Um caminho que foi sempre revisto, desenvolvido e modificado de acordo com suas experiências clínicas. Esta é a beleza do texto freudiano. Ele não tem medo do erro e nem da falta de mestria da certeza.
Se, inicialmente, a preocupação de Freud estava relacionada ao trauma e à sedução, aos poucos tende a acreditar que o trauma não era a própria sedução e sim a recordação da cena. As histéricas sofriam de reminiscências, o que fez Freud reconhecer a importância da sexualidade e a sua ocorrência em dois tempos marcantes: a infância e a adolescência. Até que Freud deixasse de acreditar em sua neurótica e passasse a privilegiar a fantasia, era com as reminiscências inconscientes que ele se ocupava: as histéricas sabiam, mas não sabiam que sabiam...
Assim, a fantasia passa a ser elemento significativo na produção dos sintomas histéricos. Foi com Dora (1905) - símbolo freudiano na compreensão da histeria que ele percebe toda a fantasmática que envolvia o sintoma conversivo. A partir daí, a angústia, provocada por uma fantasia inconsciente, passa a ter um papel decisivo na estruturação das neuroses. É essa angústia que, nas histéricas, Freud chama de inveja fálica, que seria convertida. Muda-se o cenário, muda-se a cena: o que antes era sofrido no psíquico passa a ser sofrido e gozado no corpo.
A partir da letra freudiana podemos perceber que o caminho da mulher em direção à feminilidade, coloca-a diante de uma questão: não é e nem não é. Tomada como enigma insolúvel - a feminilidade – impossível de ser apreendida – encontra na mascarada, uma ponta por onde inventar-se.
Duas palavras se repetem no percurso daqueles que se colocam no lugar da escuta destas questões: aventura e enigma, na medida em que elas fundamentam tudo o que estaria condensado na palavra feminilidade. Para o psicanalista, o elemento aventura está em supor uma viagem pelo imprevisível e no limite do indizível, o que se contrapõe ao registro fálico. Sob o registro fálico o sujeito está ligado à universalidade, a totalização, e ao controle das coisas e do outro. Sob o registro do feminino o que estaria em jogo seria outra coisa: uma postura voltada para o particular, para o não controle e o relativo. Ou seja, a feminilidade abrangeria algo muito distante da postura fálica, algo que marcaria a diferença de um sujeito em relação a qualquer outro.
Sim, de um sujeito em relação a qualquer outro, o que implica em não esquecermos que a questão da feminilidade também diz respeito aos homens. Em 1937, Freud já falava de um princípio geral que estava em ação em ambos os sexos e que, embora diversos em sua forma de expressão, referia-se a uma atitude frente ao complexo de castração. O que quer dizer que, como registro erógeno e psíquico, a feminilidade não diz respeito somente às mulheres. O que Freud nos assinala é a precariedade da condição humana se construída a partir de um referencial fálico tanto da mulher quanto do homem.
Deve-se observar que pesar de seu incansável trabalho de escuta e investigação do feminino, os impasses da sexualidade levaram Freud a se deter ante a ‘rocha viva’ da castração, que para a mulher é marcado pela inveja do pênis. Lacan, por sua vez, encara o desafio de investigar um mais além da castração – da divisão falo/castração, introduzindo a questão do gozo. É o Seminário 20 que marca o percurso do ensino lacaniano em direção a uma outra lógica distinta da lógica fálica, de atribuição dos valores fálico/castrado. A outra lógica em jogo no mencionado seminário é a das fórmulas quânticas de sexuação onde ele apresenta a oscilação da mulher o saber e o não saber. Saber sobre a falta que a constitui como ser falante, saber sobre o gozo. Saber fazer com o real do corpo, considerando é claro que o “desejo se inscreve por uma contingência corporal.”
“O ser sexuado dessas mulheres não-todas não passa pelo corpo, mas pelo que resulta de uma exigência lógica na fala. (...)
Lacan. Seminário 20.
Então, para Lacan a problemática feminina poderia ser colocada como uma conseqüência ou efeito que a função do falo como significante exerce no inconsciente e à maneira pela qual os sujeitos se declaram sujeitados à sua lei. É impossível escrever uma função que ligue direta e completamente o homem à mulher e que seja assim objeto de um saber.
No texto Freud e a Mulher, Assoun (1993) coloca o enigma como um efeito do real da feminilidade “invertendo-se numa indagação ao saber analítico”, uma provocação. Uma indagação sobre seu objeto, mas também sobre seu saber. O que implica na seguinte questão: O que tem a psicanálise a dizer hoje sobre a mulher e a feminilidade?
Será o feminino um paradoxo?
Se o desamparo feminino nos remete imediatamente para o que existe de mais incompleto no ser humano, também remete para a conseqüência maior disso: a dependência insofismável do outro. A clínica psicanalítica é a única que permite esta escuta privilegiada. E ainda que essa dependência não seja absolutamente superável porque ela estará lá - sempre presente – nos fazendo lembrar a todo o momento a fratura constitucional que marca a condição humana é ela que nos faz continuar desejantes. (Birman, 1999)
“Nas verdadeiras mulheres há sempre algo meio extraviado; há na feminilidade verdadeira, uma dimensão de álibi.” Lacan, Seminário 5.
*Leituras consultadas e recomendadas sobre este tema:
ASSOUN, P.L. Freud e a mulher.Jorge Zahar. Rio de Janeiro.1993
Birman, J.Cartografias do Feminino, Editora 34, São Paulo, 1999.
________Mal-Estar na Atualidade. A psicanálise e as novas Formas de subjetivação, Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2000.
Freud, S Psicopatologia da Histeria (1886-99) em Edição Standard das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud Vol. 1, Imago Editora, Rio de Janeiro, 1969.
________Fragmento da Análise de um Caso de Histeria (1905) Vol. VII
________Feminilidade (1933) Vol. XXII
________A Organização Genital Infantil: Uma interpolação na Teoria da Sexualidade (1923) Vol. XIX
________A dissolução do Complexo de Édipo (1924) Vol.XIX.
LACAN, J. Seminário 20. Mais, Ainda. Jorge Zahar. Rio de Janeiro. 1995.
LACAN, J. Seminário 5. As Formações do Inconsciente. Jorge Zahar. Rio de Janeiro. 1999.
Rio, Violência e Direito
Mineiros, 7/04/2011
“Veio fazer palestra para os alunos?”, perguntou a professora Dorotéia, referindo-se à programação de encontros com ex-alunos bem-sucedidos para comemorar os 40 anos da escola. Não era o caso de Wellington. Doroteia pediu que ele esperasse, pois estava ocupada. Minutos depois, começou a tragédia. Ele saiu da sala, largou a mochila, colocou o cinturão com carregadores, entrou em uma sala e anunciou: “Vim fazer a palestra”. Em seguida, mirou na cabeça das crianças da primeira fila e a disparou com um revólver 38. A outra arma, um revólver 32, não foi usada. Meninas eram maioria na sala e sentavam na frente, segundo a polícia. Gritos, dores, desespero. (O Estadão 7 de abril de 2011)
O que podemos entender do que é inexplicável? O que precisou para tamanha barbária?
Muitas perguntas sem respostas nos levam a indagar o tema da violência, da lei e do desejo.
Segundo Freud, inicialmente, numa pequena horda humana, era a força física que decidia a quem alguma coisa devia pertencer ou quem veria sua vontade executada. No início então, a lei se impõe pela força. Esta é movida por uma vontade que se aplica ao outro, um objeto. Posteriormente é que a paz social pôde se organizar "pela superação da violência por meio da transferência de poder para uma unidade maior", a comunidade comum instaurada num grupo humano e a partir deste momento o grupo dominante substitui o ato de matar pelo de escravizar. O corpo do outro pode servir ao desejo de quem impõe sua lei. Desta maneira, o vencedor "abre mão de uma parte de sua própria segurança" pois o vencido, vivo, constitui uma ameaça.
Neste episódio é o que se verificou:um jovem que se sentia completamente fora de tudo e de todos, que se constituía como existente na solidão de seu computador e no planejamento de um ato que o libertaria dos ímpios (segundo suas palavras em uma carta deixada). Sua violência é a marca da violência que desapossou o vencido e que assegura a base da tranqüilidade social obriga o vencedor, para sua própria segurança. Ação pela coação pela não-defesa do outro. De forma assustadora o agressor se sentiu o libertador numa mensagem em que ele libertaria os ímpios pela sua pureza de alma (o que ele deixou bem claro na sua carta com especificações do seu funeral). Ele se sentia obrigado a tal ato como uma resposta a algo que lhe havia sido retirado.
A violência é originária e a união triunfa assim a violência é dobrada, quebrada pela união. (Vanier 2004). Mas é essa violência que funda o poder de possuir o que é do outro, ou até mesmo o próprio outro; a violência dá origem ao direito. A união não faz a violência desaparecer, o que faz é deslocá-la. De fato, nesse momento, não é mais a violência de um indivíduo que se impõe mas sim a da comunidade; neste caso a comunidade dos excluídos;a violência garante o direito. O direito de tirar a vida de outros porque não se obteve o necessário ou o suposto do que lhe era devido. A violência assim existe em detrimento da civilização ou da tecnologia ou mesmo do sagrado.
Em efeito a calmaria social não deixa de ser uma guerra que repete incansavelmente a pilhagem original do passado, por meio da violência que se abate do vencedor sobre o vencido. Com efeito, este último não cessa de ser despojado daquilo que lhe cabe e do que produz. Lembrar que este massacre não foi em qualquer local, na escola local de construção e nem as vítimas foram ao acaso, crianças que são o simbólico do futuro. Pode-se ler assim destruição do futuro e do desejo pela alienação do terror.
Alienação do trabalho e mais-valia, segundo Marx, que Lacan propõe ler como mais-de-gozar (VANIER, 2001). Este gozo original, esta violência, circula de forma canalizada e regrada nos vínculos sociais, e torna-se a função do direito. Cada um pode, então, ter esperança de recuperar um dia um pouco daquilo de que foi espoliado. No caso de Wellington ele esperou a redenção após sua morte.
Algumas pessoas comentaram o fato do atirador ter feito com sua própria escola, com sua comunidade. Qual era o direito dele de tirar a vida de inocentes crianças, comentavam outras... O direito é o poder de uma comunidade, o direito é, ainda e sempre, violência. No caso do agressor ele se considerava no direito de usar a tamanha violência. Freud conclui: "É um erro de cálculo não considerar que o direito em sua origem foi violência bruta e que ainda hoje não pode prescindir do apoio da violência." Freud se recusa a identificar tanto a violência quanto o mal à pulsão de morte e o bem e a paz à pulsão de vida, a Eros. O entrelaçamento entre eles é fundamental. Inclusive o fato da origem tardia dessas duas pulsões na história da psicanálise provém da dificuldade que existe para isolá-las uma da outra... A grande fissura existe quando existe um domínio exclusivo de uma sobre a outra.
Este fato deixa a dúvida do agressor ter este direito de tirar a vida de crianças. O direito levanta a questão da legitimidade da violência, quer dizer, da relação não mais entre violência e direito, mas sim entre violência e justiça. A violência apontada por Freud, do submisso em relação ao dominador será, por exemplo, legítima em relação à violência que seria justificada pela vontade de conquista ou de subjugar um grupo vizinho? É possível vida sem violência?A violência bruta original e a violência necessária de hoje serão da mesma natureza?
Anna Rogéria Nascimento de Oliveira
Psicanalista
Nova Escola Lacaniana de Psicanálise
Psicóloga docente da Universidade Paulista (UNIP)
“Veio fazer palestra para os alunos?”, perguntou a professora Dorotéia, referindo-se à programação de encontros com ex-alunos bem-sucedidos para comemorar os 40 anos da escola. Não era o caso de Wellington. Doroteia pediu que ele esperasse, pois estava ocupada. Minutos depois, começou a tragédia. Ele saiu da sala, largou a mochila, colocou o cinturão com carregadores, entrou em uma sala e anunciou: “Vim fazer a palestra”. Em seguida, mirou na cabeça das crianças da primeira fila e a disparou com um revólver 38. A outra arma, um revólver 32, não foi usada. Meninas eram maioria na sala e sentavam na frente, segundo a polícia. Gritos, dores, desespero. (O Estadão 7 de abril de 2011)
O que podemos entender do que é inexplicável? O que precisou para tamanha barbária?
Muitas perguntas sem respostas nos levam a indagar o tema da violência, da lei e do desejo.
Segundo Freud, inicialmente, numa pequena horda humana, era a força física que decidia a quem alguma coisa devia pertencer ou quem veria sua vontade executada. No início então, a lei se impõe pela força. Esta é movida por uma vontade que se aplica ao outro, um objeto. Posteriormente é que a paz social pôde se organizar "pela superação da violência por meio da transferência de poder para uma unidade maior", a comunidade comum instaurada num grupo humano e a partir deste momento o grupo dominante substitui o ato de matar pelo de escravizar. O corpo do outro pode servir ao desejo de quem impõe sua lei. Desta maneira, o vencedor "abre mão de uma parte de sua própria segurança" pois o vencido, vivo, constitui uma ameaça.
Neste episódio é o que se verificou:um jovem que se sentia completamente fora de tudo e de todos, que se constituía como existente na solidão de seu computador e no planejamento de um ato que o libertaria dos ímpios (segundo suas palavras em uma carta deixada). Sua violência é a marca da violência que desapossou o vencido e que assegura a base da tranqüilidade social obriga o vencedor, para sua própria segurança. Ação pela coação pela não-defesa do outro. De forma assustadora o agressor se sentiu o libertador numa mensagem em que ele libertaria os ímpios pela sua pureza de alma (o que ele deixou bem claro na sua carta com especificações do seu funeral). Ele se sentia obrigado a tal ato como uma resposta a algo que lhe havia sido retirado.
A violência é originária e a união triunfa assim a violência é dobrada, quebrada pela união. (Vanier 2004). Mas é essa violência que funda o poder de possuir o que é do outro, ou até mesmo o próprio outro; a violência dá origem ao direito. A união não faz a violência desaparecer, o que faz é deslocá-la. De fato, nesse momento, não é mais a violência de um indivíduo que se impõe mas sim a da comunidade; neste caso a comunidade dos excluídos;a violência garante o direito. O direito de tirar a vida de outros porque não se obteve o necessário ou o suposto do que lhe era devido. A violência assim existe em detrimento da civilização ou da tecnologia ou mesmo do sagrado.
Em efeito a calmaria social não deixa de ser uma guerra que repete incansavelmente a pilhagem original do passado, por meio da violência que se abate do vencedor sobre o vencido. Com efeito, este último não cessa de ser despojado daquilo que lhe cabe e do que produz. Lembrar que este massacre não foi em qualquer local, na escola local de construção e nem as vítimas foram ao acaso, crianças que são o simbólico do futuro. Pode-se ler assim destruição do futuro e do desejo pela alienação do terror.
Alienação do trabalho e mais-valia, segundo Marx, que Lacan propõe ler como mais-de-gozar (VANIER, 2001). Este gozo original, esta violência, circula de forma canalizada e regrada nos vínculos sociais, e torna-se a função do direito. Cada um pode, então, ter esperança de recuperar um dia um pouco daquilo de que foi espoliado. No caso de Wellington ele esperou a redenção após sua morte.
Algumas pessoas comentaram o fato do atirador ter feito com sua própria escola, com sua comunidade. Qual era o direito dele de tirar a vida de inocentes crianças, comentavam outras... O direito é o poder de uma comunidade, o direito é, ainda e sempre, violência. No caso do agressor ele se considerava no direito de usar a tamanha violência. Freud conclui: "É um erro de cálculo não considerar que o direito em sua origem foi violência bruta e que ainda hoje não pode prescindir do apoio da violência." Freud se recusa a identificar tanto a violência quanto o mal à pulsão de morte e o bem e a paz à pulsão de vida, a Eros. O entrelaçamento entre eles é fundamental. Inclusive o fato da origem tardia dessas duas pulsões na história da psicanálise provém da dificuldade que existe para isolá-las uma da outra... A grande fissura existe quando existe um domínio exclusivo de uma sobre a outra.
Este fato deixa a dúvida do agressor ter este direito de tirar a vida de crianças. O direito levanta a questão da legitimidade da violência, quer dizer, da relação não mais entre violência e direito, mas sim entre violência e justiça. A violência apontada por Freud, do submisso em relação ao dominador será, por exemplo, legítima em relação à violência que seria justificada pela vontade de conquista ou de subjugar um grupo vizinho? É possível vida sem violência?A violência bruta original e a violência necessária de hoje serão da mesma natureza?
Anna Rogéria Nascimento de Oliveira
Psicanalista
Nova Escola Lacaniana de Psicanálise
Psicóloga docente da Universidade Paulista (UNIP)
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